Privatização da CEDAE
I
A questão da água no mundo tem servido como pano de fundo para um
crescente número de guerras e revoluções. Países, nações e povos que possuem
mananciais de água têm sido atacados por guerras ou pela sanha de empresas
multinacionais que querem o domínio das fontes, reservatórios e aquíferos.
Privatizar e comercializar a água passou a ser o grande negócio do
momento.
Ao contrário dos avanços de perspectivas sociais, realizados em anos
anteriores, na qual o acesso a água e ao saneamento básico eram colocados como
desafios a serem enfrentados com vistas a garantia da água como um direito
humano universal, a nova onda das privatizações que vem varrendo o mundo
reconfigura a ideia de acesso e de direto a água como um dos direitos
fundamentais à vida.
Fonte:www.saneamentobasico.com.br |
A cidade de Duque de Caxias foi colocada no centro deste debate mundial
sobre a água com a nova gestão que, iniciou suas atividades com a criação da
Central de Água e Saneamento de Duque de Caxias – CASDUC. De acordo com as
afirmações – no período eleitoral - do prefeito Washington Reis e da base de
vereadores que o apoiara durante a campanha, a companhia municipal é o primeiro
passo para o processo de privatização dos serviços de água do município, em que
pese os acordos realizados com a CEDAE, e os compromissos assumidos pelas duas
companhias em trabalharem em conjunto.
A questão da água é intrínseca ao do saneamento e, em Duque de Caxias,
assim como toda a Região Metropolitana, o problema é cada dia maior e
multiplica-se em função do crescimento desorganizado e desigual da metrópole.
De acordo com o Instituto Trata Brasil, Duque de Caxias apresenta os maiores
índices em relação ao número de pessoas internadas com diarreia e problemas
decorrentes da falta de saneamento básico.
O problema é complexo e, diferentemente, das opiniões dos defensores da
privatização – que tendem a concentrar suas atenções na água -, os especialista
em engenharia sanitária descrevem que o saneamento básico corresponde a um
sistema com diferentes serviços e ações que vão da infraestrutura e instalações
dos processos de abastecimento de água, a montagem do sistema de coleta, o
tratamento e destino final de esgotos sanitários (que compreende a rede
coletora de esgotos, interceptores, estação elevatória de esgoto, estação de
tratamento de esgoto, emissários, ligações domiciliares), além da limpeza
urbana, da drenagem e manejos de resíduos sólidos e de águas pluviais. Os
desafios são muitos e os municípios da Região Metropolitana não conseguirão
resolver sozinhos os problemas ligados ao saneamento básico.
Fonte:www.ecodebate.com.br |
Em relação a Duque de Caxias, a questão do saneamento básico sofre com a
divisão dos processos de captação e distribuição da água é do saneamento básico
com a gestão do esgoto; o primeiro, ficando por conta da CEDAE, e o segundo, em tese, sob a responsabilidade do município.
Uma análise breve sobre o problema do acesso a água no município e a
implementação de infraestrutura de saneamento revelam duas grandes contradições
na nova tendência de privatização da água: a primeira, é que o município possui
grandes fontes de água e um considerável manancial, com grande potencial de
aproveitamento, mas que historicamente ficou à disposição do município do Rio
de Janeiro e que agora tem sido destinado as empresas privadas que vem ocupando
áreas estratégicas do município - como no bairro da Taquara, no quarto distrito
onde se instalou a fábrica da Coca Cola. A segunda contradição, está ligada ao
histórico de baixos investimentos do município em saneamento básico e a grande
dependência das iniciativas federal, estadual e dos financiamentos
internacionais em relação ao saneamento básico. Isto porque o sistema de
saneamento em Duque de Caxias é fundamental para quase todos os municípios da
Baixada Fluminense e impacta sobre mais da metade dos municípios da Região
Metropolitana. Não há como o município fazer intervenções isoladas sem levar em
consideração os efeitos sobre toda região.
Rua Paiva Couceiro, em Belford Roxo, tem esgoto a céu aberto
Em um cenários de recursos exíguos fica a dúvida sobre a capacidade do
município em investir no sistema, o que levaria a abertura de concessões e
modelos privados de prestação dos serviços. Estas questões são graves e tocam
diretamente o direito ao acesso a água e ao saneamento. Se tomarmos como base o
modelo de concessão e da prestação de serviços públicos dos transportes, o
poder público não apenas irá negociar os mananciais de água da cidade, como,
também, permitirá que o capital privado explore e superfature os preços do
acesso a água como dos processos ligados ao saneamento. Tal como ocorre no
sistema de transporte, a prefeitura tenderá a pagar ao invés de recolher recursos
proveniente da exploração dos serviços de saneamento básico e, assim, deverá
repassar a sociedade os custos, como no caso da taxa de iluminação pública que
é pago nas contas da light, mas que não resulta em uma cidade mais iluminada e
segura.
Os defensores do processo de privatização dos serviços de água tomam,
comumente, os casos de Niterói e Petrópolis como exemplo, sem levar em
consideração as particularidades dos dois municípios e a autonomia de seus
sistemas. São gritantes as diferenças entre estas cidades e o caso de Duque de
Caxias que é banhada pela Baia de Guanabara e tem considerável parte dos rios,
canais, mangues e restingas, que cortam a Baixada Fluminense, localizadas em suas
terras baixas. Por outro lado, a cidade imperial e a antiga capital do estado
possuem estruturas de saneamento que foram montadas, ainda no meio do século
passado distinguindo-se completamente da realidade dos municípios da Baixada e,
em especial Duque de Caxias.
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Foto: Estefan Radovicz / Agência
O Dia
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A questão que se coloca é: quem ganhará com o processo de privatização da
água e do saneamento básico em Duque de Caxias e nos municípios da Região
Metropolitana? O continuo crescimento da Metrópole garantirá a demanda por
serviços frente ao expansão da mancha urbana no dinâmico processo de
conurbação do território, mas será que a população terá igual contrapartida na qualidade dos
serviços e na manutenção das tarifas sociais, já que são territórios marcados
por um profundo quadro de pobreza urbana?
Em uma análise superficial dos crescentes e acalorados discursos em
defesa do processo de privatização da CEDAE realizados pelos prefeitos e edis
da Baixada Fluminense, podemos cair no erro de pensar que o desejo de venda da
CEDAE está associado aos grupos empresariais locais e aos “tradicionais”
prestadores de serviços públicos destas prefeituras. No entanto, o crescente
interesse de empresas do porte da Coca Cola, Nestle, Braskem, entre outras,
apontam para um processo de maior envergadura que coloca o município de Duque
de Caxias no centro do debate sobre o direito ao acesso a água e os modelos de
empresas municipais montados com objetivo de privatizar os recursos naturais.
Saneamento básico é um direito, porém, sob o domínio das empresas
internacionais, pagaremos os mais caros preços por nossas fontes de água e a
prestação dos serviços. É um dever das novas gestões convocar a sociedade civil
para debater a questão do saneamento básico, pois, por este debate passa,
também, os problemas ligados a falta de moradia, a ocupação urbana, as favelas
e a regularização fundiária, bem como o plano diretor da cidade e, se de
caráter democrático ou privatista.
Artigo Publicado no Jornal Imprensa em Janeiro de 2017. Nº 290
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